segunda-feira, 25 de agosto de 2008

O Chiado estava a arder











Foi o primeiro a dar a notícia. Pouco passava das 5 da manhã: o Chiado está a arder, ouvia-se na TSF. Às 6 já estava no local, onde encontrou outros colegas da rádio, que arrancaram para a Baixa mal souberam do incêndio.

Foi um outro jornalista, Nuno Roby, que morava perto do Teatro D. Maria, que deu o alerta a António Pinto Rodrigues, a fazer o turno da madrugada na TSF. Saiu da redacção sem nada. «O Sena Santos, que era o editor, deu-me uns trocos para o telefone». Tinha 24 anos. Esta segunda-feira, com 44, percorreu os mesmos locais com a memória naquele dia negro, em directo para a TSF, mas agora via telemóvel.

«Coordenação?», repete em tom de pergunta à questão do PortugalDiário. «Não havia coordenação; era impossível porque éramos muitos no local, em diversos pontos do Chiado; pedíamos para entrar em directo quando tínhamos algo para relatar» e assim foi aquela longa maratona informativa. «Comecei por usar uma cabine telefónica, mas, depois de convencer um senhor na Junta de Freguesia do Sacramento, passei a fazer os directos da cave».

Depois do primeiro - ainda no estúdio da redacção, que dava conta do incêndio no Chiado - fez outro, às 11 horas, lembra-se bem, com o comandante dos bombeiros. «Insisti que precisava de entrar logo em directo; dei a notícia de que o fogo estava circunscrito». O rescaldo ainda durou mais uma semana.

Esta segunda-feira, 20 anos volvidos, percorreu os mesmos locais e reavivou memórias. «Estávamos mais ou menos divididos por locais, mas nem sempre tínhamos a noção da dimensão total do incêndio. Por vezes parecia que assistíamos a uma coisa monstruosa e outras que o fogo estava só num quarteirão».

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Foram 54 horas acordado com duas directas, sem descansar o corpo. Depois do turno da madrugada e de um dia no local, foi à rádio e depois a casa: «Precisava de comer alguma coisa e tomar um banho. Acho que tomei dois e mesmo assim sentia o cheiro a fumo». Regressou à rádio, para mais uma madrugada, numa altura em que a TSF tinha apenas seis meses.

«Foi a nossa prova de fogo», diz, pedindo desculpa pela expressão. Mas cabe como uma luva: «Ninguém sabia o que era a TSF e nem percebiam quando pedíamos para fazer uma chamada para "entrar em directo". Em directo? Para quê?». Era outra realidade, outro tempo.

Ficam memórias de pormenores, imagens que gravou depois de ter estado tão perto da tragédia que foi notícia nos media estrangeiros. «Lembro-me de apanhar com fagulhas e de, no início, os bombeiros deixarem que andássemos no limite; só não íamos apagar o fogo porque não tínhamos mangueiras. Mas não havia perímetro de segurança. Só ao final da manhã, bloquearam a passagem». Aos jornalistas e aos muitos curiosos que se dirigiram para o local.

«A TSF, para o ouvinte, começou realmente nesse dia», garante o jornalista António Pinto Rodrigues, que recorda o prémio Gazeta pela cobertura em directo, mas admite, sem rodeios, que se cometeram muitos erros naquela maratona. «Éramos novos e estávamos no início da profissão. Tínhamos um espírito diferente, um grande companheirismo e fomos uma grande pedrada no charco da informação que se fazia na altura».

Esta manhã, chegado à rua do Sacramento, às 8 da manhã, estava ainda tudo fechado. Antes de falar com comerciantes e residentes no Chiado que viveram aquele 25 de Agosto negro, Pinto Rodrigues fez os mesmos percursos, esteve nos mesmos locais, e recordou aquelas horas negras da história de Lisboa com vinte anos.

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